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Grupo de Trabalho 4
O Intercurso das Imagens Profissionais do Médico e do Assistente Social Sob a Ótica do Gênero

Dayse de Paula Marques da Silva[1]

 

Introdução

Esse estudo é uma confluência de temas apresentados nos cursos de mestrado e doutorado, realizados ao longo dos últimos 10 anos. No primeiro, foi desenvolvida uma discussão sobre a perspectiva de constituição de família e investimento profissional em mulheres universitárias no interior de um curso de tradição feminina - o Serviço Social. No segundo, a partir do avanço observado no debate e na reflexão sobre as relações de gênero, foi escolhida a Medicina como campo de investigação, por se constituir uma profissão de tradição masculina que apontava mudanças no seu perfil profissional, com uma inserção crescente de mulheres.

Nesse percurso foi muito interessante observar alguns pontos de interseção entre as duas carreiras, como, por exemplo, a função social da profissão, o discurso vocacional, as vertentes humanistas marcantes na formação profissional. Entretanto, existe uma disparidade evidente quanto ao reconhecimento e prestígio dessas profissões na sociedade[2].

O Serviço Social configura-se uma profissão nova, contemporânea, criada muito recentemente, em comparação com a Medicina, que se caracteriza como uma profissão tradicional, com referências, ainda, na Idade Antiga. Portanto, esta última tem a seu favor a tradição, a imagem profissional moldada ao longo dos séculos e de forma muito mais determinante, a sua permanência ao longo desse percurso como uma função nobre e de reconhecida importância.

Com raízes em iniciativas da Igreja Católica, cujos dirigentes preocupavam-se com as conseqüências da sociedade industrial, estabelecendo encíclicas[3] no século passado que expressavam o interesse numa ação social, o Serviço Social consolida-se como profissão na segunda metade do século XX, acompanhando a trajetória de afirmação do Estado de Bem-Estar no segundo pós-guerra.

O que interessa nesse momento do estudo é explorar, comparativamente, as hierarquias profissionais nos campos citados, conforme a inserção por gênero, classe e etnia.

Tomando como referência básica para a reflexão a constituição de identidades profissionais, procura-se focalizá-las da perspectiva de um olhar múltiplo que contemple aspectos fundamentais no comportamento dos indivíduos e, ainda, muito pouco considerados no campo das profissões.

A pesquisa avançou na análise sobre as diferenças de gênero observadas no espaço profissional, e o presente texto irá explorá-las, indicando algumas considerações sobre as diferenças étnicas e de classe que começam a ser abordadas no estudo.

 

O campo das profissões

O acesso das mulheres ao ensino superior é um fenômeno recente, e o seu impacto no mundo do trabalho é, ainda, pouco dimensionado no estudo das profissões. Esse campo se constitui a partir de um debate sobre a configuração do conhecimento científico, a padronização de determinados conceitos, a exclusividade cognitiva e a formação básica para o exercício legítimo de determinada função na sociedade. Enfoca, prioritariamente, a sua estrutura organizacional - as corporações, associações, a universidade -, instituições que surgem para regulamentar a atuação profissional. São observadas as hierarquias entre grupos profissionais, conforme o seu prestígio social, que é uma resultante da capacidade de gerar ganhos monetários, de atender demandas, associada à absorção de conhecimentos considerados mais complexos. O acesso à qualificação de nível superior vem-se ampliando no Brasil, principalmente, após a reforma universitária na década de 70, que não só permitiu que estratos sociais mais baixos da população chegassem à Universidade, mas também favoreceu a proliferação de inúmeras instituições no país.

O que interessa enfatizar nessa reflexão é o argumento levantado por alguns estudos na perspectiva das relações de gênero, quando se referem a mixité,[4] observada em países que já conseguiram garantir mecanismos igualitários na formação profissional e inserção no mercado de trabalho.

 

A qualificação técnico-científico versus aptidões naturais

Partindo-se do pressuposto da relação direta entre a qualificação e o sistema educacional, o acesso das mulheres ao ensino superior torna-se um ponto central para a reflexão sobre as novas regras e condutas no ambiente de trabalho. Nesse espaço se dá a segmentação por sexo, e vão-se delinear as profissões “femininas e masculinas”. As mulheres e homens tendem a se concentrar em determinadas áreas específicas como, por exemplo, as humanidades e as tecnológicas, respectivamente.

As carreiras que se apresentam como destinadas às mulheres - Enfermagem, Nutrição, Serviço Social, Psicologia e Letras - levam o selo do desprestigiado, ao contrário daquelas que tendem a concentrar mais homens.

Perceber a dimensão da desvalorização ampliada das profissões, levando-se em conta o assalariamento e a burocratização, não significa perder de vista esta especificidade no que diz respeito a algumas características de seus sujeitos - o gênero. Principalmente, quando estas características expressam “qualidades” que são interpretadas como condição e aptidão adquirida para o exercício da atividade profissional, como vem sendo o caso das profissões femininas.

Até há pouco tempo atrás, o ingresso das mulheres no ensino superior e na formação profissional dava-se em setores freqüentemente  relacionados com suas aptidões ou qualidades “naturais”. Esse é um dos mecanismos que permite a hierarquização das profissões[5].

O delineamento da fronteira fica mais complexo a partir da inserção das mulheres em profissões tradicionalmente masculinas, como é o caso da Medicina. Essas profissões usufruem de um grau de prestígio ainda bem acentuado, apesar do processo de assalariamento e burocratização.

A entrada feminina nestes campos tem favorecido uma interpretação baseada no discurso igualitário, negador das diferenças de gênero, que tenderia a desaparecer no interior do campo profissional. Entretanto, já se argumenta na perspectiva de “novas fronteiras” da divisão sexual do trabalho.

Da segregação ao gueto, chega-se à convivência no mesmo espaço profissional, à “mixidade” de gênero, o que pressupõe condições iguais de exercício das funções. O fato de as mulheres estarem penetrando em setores anteriormente fechados, masculinos, com exigência de alta qualificação, abre um leque de perspectivas “otimistas”, visando à  no sentido de promoção de igualdades num primeiro momento, e, a partir desta “novidade”, passou-se a argumentar no sentido de uma supressão das diferenças entre homens e mulheres no mercado de trabalho. Entretanto, outros estudos vêm mostrando a inexistência de igualdade e de convívio pacífico em condições de mixité nesses “novos” lugares de inserção feminina.

Enfatizam-se as funções assumidas pelas mulheres nas empresas, tanto públicas, como privadas, apresentando a mesma formação escolar que os homens; cargos de responsabilidade; a concepção que as próprias mulheres têm desta situação “ideal”; formas de emprego e status; formas de gestão “feminina”; o avanço jurídico e o avanço de fato sobre as desigualdades de gênero, abordando-se aí as iniciativas do Estado na implementação de políticas públicas favorecedoras da mixité.[6]

Os estudos que tratam da ausência da mixité nos espaços profissionais tradicionalmente masculinos que foram “conquistados” pelas mulheres apresentam dimensões muito interessantes do problema da segmentação do mercado de trabalho por sexo.

Uma dessas dimensões diz respeito ao fato de como o gênero é apropriado de forma a manter hierarquias e o conseqüente isolamento dos grupos considerados menos legítimos, que não correspondem às exigências para o ingresso “à altura”, com “honra”, naquele espaço. Algumas passagens dos textos analisados levam à conclusão de que as mulheres não conquistaram, por seus próprios méritos, a sua inserção nesse universo. Elas foram “aceitas” e têm que corresponder às exigências com mais rigor, respeitar as regras do lugar custe o que custar, até mesmo o que é considerado “próprio” da identidade feminina. A partir daí, vão-se tornando visíveis os obstáculos que se apresentam para esse grupo - o das mulheres, num espaço que “aparentemente” oferece condições igualitárias de desenvolvimento e realização na carreira profissional.

 

A feminilização e a perda de prestígio

Há uma associação entre a inserção de mulheres em alguns setores e a sua desvalorização no mercado de trabalho.

Estudos que tratam da degradação da mão-de-obra, considerando o crescente assalariamento, racionalização e burocratização do processo de trabalho a partir do desenvolvimento do capital monopolista, argumentam a “proletarização” dos profissionais. Coloca-se em xeque a própria sobrevivência do modelo profissional liberal, cujo alicerce é a autonomia. Constata-se o aumento da absorção de mulheres no momento em que estão ocorrendo estas mudanças na organização do mercado.[7]

O que pode ter sido um fato “coincidente” torna-se, em alguns momentos, uma explicação, isto é, o setor se desqualificou porque se feminilizou ou se feminilizou porque se desqualificou.

Para superar este automatismo, faz-se necessária uma análise que considere os mecanismos que regulam a participação por gênero no espaço profissional.

É evidente a localização desfavorável das mulheres, em geral, no mercado de trabalho. Mas pensá-la no âmbito das profissões coloca uma especificidade, a que diz respeito à qualificação como um elemento determinante do status profissional. Evidencia-se que a qualificação com base no conhecimento científico não basta para inserir o profissional na estrutura do emprego de forma isenta e igual.

 

As mulheres na Medicina e no Serviço Social

Observar a capacidade de as mulheres assumirem posições de ponta no interior da Medicina revela o potencial de mudança e eqüidade relativa ao gênero na estrutura do emprego, tendo em vista a tradição masculina do grupo profissional, ao contrário do Serviço Social - uma profissão historicamente feminina.

As primeiras ingressam numa carreira bem mais competitiva e prestigiada. A priori, a qualificação das mulheres médicas apresenta maior status. Nesse sentido, as médicas tendem a se posicionar melhor em comparação com as assistentes sociais. Entretanto, vislumbram-se dois pontos em comum quanto a sua inserção no mercado de trabalho: uma desqualificação das atividades desempenhadas por mulheres e uma associação com suas aptidões naturais.

No campo da Medicina, vem-se observando a tendência de as mulheres se concentrarem na Pediatria - uma especialidade que pressupõe o cuidado com as crianças e, ao mesmo tempo, desvalorizada no interior da categoria profissional.

A feminilização da Medicina começa a ser apontada em alguns espaços de discussão da própria categoria médica no Brasil. Em muitos cursos universitários, as mulheres já ocupam metade das vagas. Valoriza-se no discurso o avanço que representa esse fato para as mulheres e para a própria profissão. Entretanto, não se problematizam ou discutem os lugares que esses sujeitos estão ocupando na hierarquia profissional. E, ainda, justifica-se essa inserção com base nas aptidões femininas para determinadas atividades. O presidente do Conselho Federal de Medicina, Waldir Paiva Mesquita, não se surpreendeu com a presença cada vez maior desse “exército” de mulheres na Medicina, certo de que a profissão é compatível com a própria vocação biológica da mulher. “É uma tendência natural, uma vocação biológica da mulher ser médica” diz. Para ele, os pacientes que têm a possibilidade de chegar até uma médica saem mais satisfeitos, pois o sexo feminino facilita muito mais a relação médico-paciente. [8]

Confirmando os dados sobre a concentração por sexo nas especialidades médicas, a Revista Prodoctor Resident apresenta uma reportagem sobre a seleção da UNICAMP, destacando a distribuição de homens e mulheres nas áreas médicas. Registra o seguinte:

se a examinarmos com atenção, é possível enxergar os rumos que a Medicina está tomando no Brasil. O mais evidente dos traços que a relação revela é a inexorável tendência para a predominância das mulheres, tese aliás já levantada em outras edições desta mesma publicação. De acordo com a lista de aprovados da UNICAMP, 207 mulheres foram aprovadas, ou cerca de 45% do total. Capitaneando o ranking das especialidades mais procuradas, a pediatria, com 57 aprovados e uma maioria esmagadora de mulheres: 52, ou 91%, e apenas cinco homens[9].

Chama a atenção também para a concentração masculina na cirurgia.

Mas desequilíbrio mesmo observa-se na (des)proporção entre homens e mulheres aprovados em cirurgia geral. A hegemonia masculina é gritante. Dos 38 aprovados, 36, ou 95%, são homens. Outras explicações surgem para a escolha dessas especialidades de forma diferenciada. “Não é de hoje que a pediatria é uma especialidade tradicionalmente dominada pelas mulheres. Creio que elas despertam mais confiança nos pais”, acredita o pediatra carioca Ricardo Lemos. Quanto `a cirurgia, é uma tendência que segundo o secretário-geral do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, Dr. Ronaldo Vianna Sales, manifesta-se devido ao desejo de realização da maternidade. O desejo de ser mãe leva muitas mulheres a procurarem outras especialidades ou subespecialidades da cirurgia. Nas novas turmas de cirurgia pediátrica, a proporção favorece as mulheres. São cerca de 75% dos inscritos. (¼) Nos últimos anos, houve um crescimento significativo no número de médicas interessadas em se especializar em cirurgia da mão. É uma especialidade que requer muita delicadeza e precisão. Talvez por isso tenha despertado o interesse entre médicas”[10].

Algumas publicações norte-americanas sob o recorte do gênero evidenciam um olhar sobre a acomodação dessas diferenças, ainda pouco percebidas, nas condições de trabalho dos médicos no Brasil.

There are many ways in which the increasing number and proportion of female pediatricians are undoubtedly altering characteristics of the pediatrics specialty. One of the ways we will examine is how specialty and practice area preferences of all pediatricians are affected by the preferences of female pediatricians. For example, if there are proportionately more pediatric generalists versus subspecialists now than before, is it because of the preferences of women, or are there other factors that are affecting the specialty and practice distribution of all pediatricians? (BROTHERTON, Sarah et al., 1997, p. 11).

O artigo chama atenção para um aumento, a partir de 1990, da preferência das mulheres pela prática mais generalista da Pediatria, evitando as subespecialidades. “Pediatric allergy and pediatric cardiology appear to be more attractive to male pediatricians” (BROTHERTON, Sarah et al., 1997, p 17). Aponta também para a maior atuação de pediatras masculinos em consultório do que pediatras do sexo feminino e uma tendência maior de assalariamento no exercício da Pediatria generalista do que a referente à subespecialidade. E observa ainda que, nessa área, as diferenças se mostram com bastante ênfase: “There are sex differences in other areas, but none of the magnitude we find for the odds of practicing general pediatrics” (BROTHERTON, Sarah et al., 1997, p 17) [11].

Na Cirurgia, observa-se uma hierarquia muito grande entre homens e mulheres, onde as dificuldades manifestam-se com mais nitidez. O texto assinala a ausência de cirurgiãs em postos mais elevados e a defasagem na titulação acadêmica, limitando a sua inserção como preceptoras na formação de outras cirurgiãs, o que facilitaria a ascensão de outras colegas.[12]

Nesses estudos, a Cirurgia e a Pediatria também são destacadas como especialidades concentradoras de homens e mulheres respectivamente, e eles se propõem a discutir com mais profundidade a permanência das diferenças de gênero no interior de uma carreira profissional, cuja escolha, inclusive, vem indicando uma superação da inserção masculina. Estão atentos, ainda, a outras dimensões que possam interferir nessa trajetória que não apenas o gênero.

these concurring trends suggest the possibility that whether a pediatrician practices or in a subspecialty may be affected by any combination of the following factors: age, sex, and the year in which the pediatrician was queried[13] (BROTHERTON, Sarah et al., 1997, p 17).

Esse problema não está sendo considerado em sua devida proporção na Medicina brasileira. É como se a categoria dos médicos ainda estivesse sob o impacto das mudanças tecnológicas, do assalariamento, isto é, sentindo e tentando compreender as alterações externas que repercutem em sua prática. A configuração das especialidades, assim como a inserção por gênero, diz respeito às acomodações internas das “pressões” externas. As respostas serão diferentes conforme os sujeitos e as situações envolvidas.

Considerando os depoimentos das mulheres que escolheram a Cirurgia como especialidade, ficam bem evidentes as dificuldades de garantir a mixité no campo profissional da Medicina.

Aquilo me incomodava muito, porque eu detestava obstetrícia, aquele negócio de nascer, eu achava que ia ter filho de parto normal e tal. A primeira vez que eu vi um parto, falei que nunca na minha vida, se algum dia eu tivesse filho ia ser de parto normal, e aquela coisa de ginecologia e obstetrícia eram quatro anos. Cada vez eu gostava menos e eu não via muito como me livrar daquela situação porque a vida leva, te conduz a uma determinada coisa e fica difícil, às vezes, de sair, né? Aí, um dia: “Eu não vou mais”. Eu me livrei do noivo, da ginecologia e da obstetrícia. Porque o que eu sempre quis fazer realmente foi Cirurgia Geral. Mas eu tive muita força. Tive um chefe aqui, o professor, se ele não tivesse me aberto tantas portas, eu não teria conseguido, porque é difícil, muito difícil; ele achava que eu tinha jeito e que eu podia fazer. Então, ele me ajudou, não diretamente; ao contrário, ele exigia sempre mais de mim, tolerava uma porção de coisas nos residentes homens que ele não tolerava em mim. Uma vez, eu não sei por que, me aborreci aqui e desabei a chorar, e ele achou que eu jamais podia fazer uma coisa dessas. E ele tá certo, porque as mulheres sempre usam esse tipo de argumentação, que acaba sendo contra a gente. A gente tem que ser duas vezes melhor ou três, tem que trabalhar três ou quatro vezes mais, tem até que ter um pouquinho de testosterona a mais, porque senão não dá não. Se você deixar, eles já quase cortam a sua cabeça, você é um zero à esquerda, não te dão a menor importância. Você tem que se fazer valer mesmo, e para isso acontecer tem que brigar o tempo todo, tem que estar sempre mal-humorada e zangada. Porque nunca a gente consegue assim: “Poxa! Deixa eu fazer?” Isso não dá certo. (Depoimento de uma Cirurgiã Geral)

Tudo o que você faz, eu cansei de ouvir dizer: “Fulana é muito agressiva, é não sei o quê”! Isso é por quê? Eu faço como o homem faz. Mas quando uma mulher é que faz assim, você vai lá e “quebra o pau”, entendeu? E diz uns negócios, aí você é machuda, entendeu? (Depoimento de uma Cirurgiã Plástica)

            As mulheres no Serviço Social não encontram os mesmos obstáculos que as médicas. Elas estão no seu espaço próprio, lugar reservado ao desempenho de suas aptidões “naturais”. Vão ter mais “trânsito” na hierarquia interna do campo profissional. Será mais freqüente a ocupação de cargos e chefias por mulheres.

            O fenômeno que interessa observar comparativamente é a tendência de concentração das médicas em determinados lugares que reproduzem a associação da qualificação técnico-científico com as aptidões femininas, como é o caso da Pediatria. Buscar, a partir disso, desvendar os mecanismos internos de pressão sobre mulheres que se interessem por atividades consideradas impróprias ao universo feminino, como a Cirurgia, por exemplo.

            Confirmando-se esse processo, o Serviço Social - uma profissão majoritariamente feminina - e a Medicina - tradicionalmente masculina -,  vão apresentar um outro ponto de interseção: a tendência à desqualificação da mão-de-obra feminina ou das tarefas que lhe cabem na sociedade. Ao mesmo tempo, torna-se fundamental uma observação do problema que o contemple de forma bilateral, isto é, onde estão se localizando homens e mulheres e como se estabelecem as hierarquias a partir do gênero, tanto numa carreira como na outra.

 

A etnia e a classe na configuração profissional

As diferenças étnicas[14] e de classe social nos dois cursos universitários são visíveis. Nos últimos anos, vem-se observando uma inserção bem mais acentuada de negros no Serviço Social do que na Medicina.

Damos destaque aqui à inserção dos negros brasileiros, tendo em vista o fenômeno recente do aumento do número de indivíduos de cor negra nos cursos universitários, grupo historicamente segregado, fato que vem sendo acentuado em algumas análises que colocam em debate os mecanismos de exclusão social. Entretanto, o estudo pretende dimensionar a inserção de outras origens nos cursos em foco, como, por exemplo, a de estrangeiros ou seus descendentes.

Considerando a trajetória dos negros no Brasil e os mecanismos de exclusão existentes, as chances de ingresso em cursos competitivos como a Medicina diminuem bastante [15]. As exigências da formação - uma seleção rigorosa, implicando um preparo educacional anterior, dedicação em tempo integral, material de estudo de custo alto e mensalidades muito caras (caso houvesse tentativa nas instituições de ensino privadas) -  influenciam na escolha de carreiras em áreas mais acessíveis, como a de Ciências Humanas.

A estrutura dos cursos universitários neste último campo favorece a entrada de grupos sociais de poder aquisitivo mais baixo, pois os critérios seletivos correspondem mais a sua demanda [16].

O Serviço Social teve uma mudança significativa no perfil socioeconômico dos seus profissionais. As primeiras assistentes sociais pertenciam a estratos sociais elevados[17]. Conforme foram ampliando-se as chances de ingresso no curso - surgimento de escolas sob a responsabilidade do Estado e gratuitas -, percebe-se uma alteração fundamental nesse perfil profissional. Há um rebaixamento paulatino do poder aquisitivo dos candidatos, encontrando-se, hoje, uma participação significativa de estratos sociais que correspondem aos níveis mais baixos de renda.

Considerando os itens em discussão - etnia e classe -, o Serviço Social tende a permanecer numa posição inferior à Medicina na hierarquia profissional. Entretanto, as mudanças que se operam nessa última, tanto no movimento mais amplo que atinge as profissões liberais - assalariamento, perda de autonomia, aumento excessivo de instituições de ensino, fatores que levam a uma queda da qualidade da formação e inserção no mercado de trabalho, como aquelas relativas ao gênero têm provocado oscilações no patamar do status profissional.

No Brasil, as implicações das relações de gênero vêm sendo subestimadas em ambos os campos profissionais. Associar essas dimensões em cursos universitários com prestígio tão extremo mas com interfaces importantes na sua função social implica, a nosso ver, uma análise mais profunda sobre os mecanismos geradores de hierarquias no mercado de trabalho. O processo de feminilização da Medicina aproxima-a do Serviço Social, quando se verifica uma reprodução de relações assimétricas entre homens e mulheres na escolha da especialidade médica. É esse ponto de interseção que a pesquisa vem enfatizando, o que não pode ser analisado sem relacioná-lo aos itens aqui discutidos, pois são dimensões que interagem, formando níveis diferenciados de hierarquias.

Investe-se, também, numa perspectiva de enfrentamento das desigualdades, dando-se destaque, inclusive, às relações de poder interprofissionais, e coloca-se em debate a legitimidade e importância de algumas funções que se concentram no setor dos serviços e cuja expansão, no Brasil, se deve ao crescimento e gestão do Estado na área da saúde.

 

A mão-de-obra feminina no setor da saúde

 Grande parte dos assistentes sociais estão alocados nesse setor, que vem absorvendo de forma crescente o contingente feminino da mão-de-obra mais qualificada - aquele que teve acesso aos cursos de nível superior[18]. Esse é outro ponto de interseção entre o Serviço Social e a Medicina.

A partir de um processo anterior de feminilização do próprio setor, pretende-se observar as hierarquias reproduzidas com base no gênero mas obscurecidas pelo discurso científico - o que importa é a “competência”, a qualificação para o desempenho da função - e, ao mesmo tempo, questionar as hierarquias que se estabelecem com base nesse mesmo discurso, inserindo as atividades profissionais da área biomédica num patamar mais elevado de status profissional do que as que pertencem à área de humanas.

A pergunta que estará presente em todo o percurso da investigação, concomitante com o debate sobre as desigualdades de classe, etnia e gênero, é a seguinte: Por que a função do médico é considerada mais importante do que a do assistente social?

Para respondê-la, a incursão no debate sobre as profissões torna-se fundamental e percebe-se que o terreno é bem “movediço”. A constituição, na mentalidade ocidental, do campo científico que legitima ou deslegitima participações implica numa discussão mais atenta sobre os processos de certificação do conhecimento no qual a universidade é um dos mecanismos prioritários

Quando se duvida da cientificidade de determinadas atividades, sendo esse o critério legitimador de sua inclusão no campo profissional, imediatamente estarão inferiorizadas nessa hierarquia. Como as mulheres, historicamente, sempre encontraram obstáculos no acesso ao conhecimento, a sua relação com o científico foi mais limitada. Esses obstáculos não deixam de existir mesmo quando o ensino superior é aberto para elas. É preciso atenção quanto a esse fato. As mulheres vão-se conduzindo para lugares onde o que é considerado científico não é o ponto forte, mas o cuidar, o ajudar, o “acalentar”. O científico está associado ao que é tecnológico e não ao que é humanista[19].

O número majoritário de mulheres no campo da saúde em áreas hierarquicamente inferiorizadas revela essa tendência ao cuidar, ao servir, sem uma preocupação com a contrapartida - bons salários [20].

Entretanto, as mulheres começam a entrar nos campos mais prestigiados, que estabelecem uma relação mais direta com o científico - a Medicina. Mas se agrupam em lugares considerados femininos, associados ao cuidar, ao materno - a Pediatria, hierarquicamente inferior no campo profissional. As especialidades mais valorizadas, ultimamente, são aquelas que demandam uso de equipamentos de alta tecnologia, sofisticados e complexos, resultados do avanço científico. Resta saber se vão continuar a não ser atrativas para as mulheres e desvendar os mecanismos de perpetuação dessas tendências, considerando as motivações dos homens para a sua permanência nas mesmas.

Quanto a esse aspecto da natureza mais científica ou mais humanista de determinadas profissões, uma ambigüidade muito peculiar se estabelece para a Medicina. A sua gênese está associada a uma filosofia humanista e tem interfaces muito próximas com a trajetória da Igreja, desde que essa foi a instituição principal na transmissão e veiculação do conhecimento por muitos séculos na sociedade ocidental. É muito freqüente a associação da imagem do médico e do sacerdote, considerando o seu perfil tradicional. A frase “a Medicina é um sacerdócio permanece como referência para aquele médico dedicado, mais velho, que vê as mudanças no campo profissional como uma perda dos valores essenciais no exercício da profissão, processo esse que vem sendo debatido no interior da Medicina, hoje, num movimento nacional de mudança curricular no Brasil.

 

As mudanças curriculares no Serviço Social e na Medicina

Outro ponto de interseção entre essas duas carreiras, no Brasil, é o movimento que iniciaram, de alcance nacional, para alterar o currículo nos cursos universitários, implantando fóruns de discussão em várias regiões do país [21]. O que mais chamou a atenção, no acompanhamento desse debate, no espaço da Medicina foi a preocupação com um retorno, um resgate da formação humanista do médico, existindo algumas experiências já iniciadas em algumas universidades do país.

A pesquisa tem como uma de suas etapas metodológicas o estudo dos currículos de duas universidades públicas, no Rio de Janeiro, no âmbito do Serviço Social e da Medicina. A formação humanista no primeiro é uma forte influência, ainda hoje e, no universo da Medicina, coloca-se a necessidade de um “resgate” dessa formação. Esse aspecto vai ser abordado a partir de um olhar específico sobre as formas de inserção da mulher nesses espaços profissionais e a dissociação entre a compreensão da natureza humanista e científica das carreiras.

 

Referências bibliográficas

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[1] Professora Adjunta da Faculdade de Serviço Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e Coordenadora do Programa de Estudos de Gênero, Geração e Etnia: demandas sociais e políticas públicas (PEGGE).

[2]  “É  natural que a demanda pelas carreiras universitárias reflita, pelos menos parcialmente, as sinalizações e os estímulos oriundos do mercado de trabalho. Assim, no vestibular da UFRJ de 1993, mais da metade dos candidatos disputavam vagas nas três carreiras melhor remuneradas: Direito, Engenharia e Medicina. Neste contexto, (¼) conforme o esperado, o primeiro fator extraído, com larguíssima predominância e dando conta de cerca de 76% da variação comum, indica claramente uma dimensão geral de hierarquia das carreiras em temos de desempenho acadêmico do alunato a elas recrutado. No topo desta hierarquia encontram-se as carreiras de Medicina, Odontologia, Engenharia e Economia, nesta ordem de cima para baixo; no piso da hierarquia encontram-se as carreiras de Educação Física, Pedagogia, Educação Artística e, finalmente, Serviço Social.” SILVA, Nelson do Valle, n. 4, 1994.

[3]“A intelectualidade católica procurará a adaptação à realidade nacional do espírito das Encíclicas Sociais Rerum Novaram e Quadragesimo Anno, munindo a hierarquia e o movimento laico de um arsenal de posições, programas e respostas aos problemas sociais, ao formular uma via cristã corporativa para a harmonia e progresso da sociedade: Deus é a fonte de toda justiça, e apenas uma sociedade baseada nos princípios da cristandade pode realizar a justiça social.” CARVALHO, Raul e IAMAMOTO, Marilda Villela -1998, p. 158.)

[4] É uma noção que implica garantir a convivência entre os sexos, sem que haja a predominância de um modelo masculino ou feminino na organização do trabalho. “Mais qu’est ce que la mixité? Et dans quelles conditions peut-on affirmer qu’elle est realissé? De l’examen de la définition et de l’univers sémantique du terme dans le Petit Robert, il ressort que pour pouvoir parler de mixité, il faut deux conditions: 1) qu’il y ait à tout le moins deux entités en présence l’une de l’autre, partageant le même espace 2) que ces deux entités se mêlent l’une à l’autre. Autrement dit, il n’y a pas de mixité si les deux entités ne se mêlent pas ou si, par une quelconque opération, l’une des entités subissait une transformation qui la rendrait semblable à la première, ce qui annulerait la première des conditions de la mixité puisqu’il ne subsisterait, à toutes fins pratiques, qu’une seule entité.” FAHMY, Pauline. 1992, p.137.

[5] A denominada “escolarização do doméstico” expressa bem o processo de formação de uma profissão e os matizes simbólicos que o marcam. Nesse caso, inteiramente associado às qualidades femininas, ao saber “feminino”, mas um saber desqualificado porque não científico. Ele precisa revestir-se do discurso científico para se “profissionalizar” e daí ser aceito nesta ordem. Por outro lado, as iniciativas oficiais, institucionais incentivam a criação do espaço segregado, do gueto. Abrem quadros dirigidos às mulheres, priorizando a sua seleção, como foi o caso do governo de Vargas na década de 30 no Brasil. Mas ao se tratar de “profissões femininas”, ainda encontra-se dentro do espaço feminino. A fronteira está bem demarcada. A mulher chega ao mercado de trabalho de forma “mais qualificada” mas conforme a sua natureza, sem que sua aptidões sejam mal utilizadas ou confundidas. As mulheres realizam atividades profissionais para as quais estão melhor preparadas, especificamente habilitadas - as profissões femininas, para mulheres, que, agora, podem ser consideradas “profissões”, desde que tenham um currículo baseado em tal número de horas, com disciplinas de tantos créditos, com base em tais conformidades teórico-científicas que lhes habilita a um diploma (LOURO, Guacira Lopes, 1995).

[6] FAHMY, Pauline, 1992.

[7] BRAVERMANN, Harry, 1981.

[8] Revista Prodoctor Resident, 1996, p.10.

[9] Revista Prodoctor Resident, 1997, p. 15.

[10] É interessante observar que o tema apresentado na capa é “Guerra dos Sexos Na Residência”. Revista Prodoctor Resident, 1997, 15.

[11] “Male pediatricians were consistently more likely to report that their primary activity was in direct patient care (combining both forms of direct patient care). From 1988 through 1992, male pediatricians were much more likely to be self-employed than female pediatricians. Men were always more likely to be self-employed than not self-employed (hereafter, for ease of discussion, this category will be referred to as salaried, although not all those who are not self-employed are salaried). Male pediatricians also were more likely to be in administrative positions than female pediatricians, whereas a greater proportion of women than men were in academic positions, fellowships, or public health” (BROTHERTON, Sarah et al., 1997, p. 9-10).

[12] “This study confirmed that the majority of both women and men plastic surgeons had mentors but that few were women. The promotion of deserving women plastic surgeons to positions of authority is essential to improve opportunities for career development for young women entering the specialty” (CAPEK, Lucie,; EDWARDS, Dorothy; MACKINNON, Susan E., 1995).

[13]“Gender by itself did not affect the likelihood of those younger than 45 practicing general pediatrics. Within the younger group, the likelihood of practicing general pediatrics decreased slightly with each year o age, meaning that for any given survey year or gender, the younger the pediatrician the greater the likelihood of practicing general pediatrics. The odds increased 9% percent for each survey year of a younger pediatrician practicing general pediatrics, with the odds for women increasing slightly more each year (10%). The former means that, for example, a younger pediatrician of either sex was 27% more likely to be in general pediatrics in 1992 than in 1989. The latter suggests that this trend was stronger for women than for men” ((CAPEK, Lucie,; EDWARDS, Dorothy; MACKINNON, Susan E., 1995, p. 13).

[14] Utilizamos o termo etnia nesse trabalho enquanto conceito que revela diferenças socioculturais de agrupamentos, com base não apenas na cor, mas também nas origens regionais e nacionais desses agrupamentos dentro de um determinado espaço geográfico. Estamos incluindo um olhar para as manifestações religiosas, principalmente porque o curso de Serviço Social apresenta em sua trajetória uma forte influência de formação nesse campo.

[15] “Os trabalhos aqui realizados apontaram para o fato de que ser negro no Brasil  hoje significa ocupar os estratos mais baixos da hierarquia social, o que representa possuir níveis inferiores de instrução, de ocupação e de renda (Valle Silva e Hasenbalg, 1991). Em outros termos, os negros estariam destinados pela sociedade a viver nas piores condições de vida. O que, parece, perpetuaria esse estado de coisas seria o fato de que também  o negro ver-se-ia excluído das possíveis aberturas que a estrutura social ofereceria à mobilidade social ascendente, via sistema formal de ensino e mercado de trabalho.” (TEIXEIRA, Moema de Poli, 1998).

[16] “Focalizando agora o curso de Ciências Sociais no IFCS, podemos dizer que a impressão que emerge quando examinamos as informações socioculturais preenchidas pelos candidatos quando da inscrição no vestibular é que os classificados para o referido curso são recrutados entre jovens de famílias de recursos relativamente modestos quando comparados com os demais estudantes universitários. Vejamos alguns indicadores disto, utilizando ainda as informações sobre os alunos classificados em 1993: 1. No quesito relativo à educação paterna cerca de 37% dos classificados indicaram que seu pai não chegou a completar o 2º grau; 2. No quesito relativo à ocupação paterna 62% dos classificados responderam que seu pai ou era um militar não-oficial, ou tinha uma ocupação de nível médio ou tinha uma ocupação manual; 3. No caso da ocupação materna, o total equivalente ao quesito anterior chega a 75%, com quase 30% das mães trabalhando em ocupações manuais; 4. No quesito relativo ao próprio trabalho, cerca de 42% dos classificados indicaram que já trabalham, sendo que 16% em horário integral. A maioria dos classificados (52%) trabalham ou já trabalharam antes; 5. Um quesito que tem eventualmente importância para alguns problemas analisados mais adiante diz respeito à conciliação entre trabalho e estudo. Neste quesito apenas 6% dos classificados responderam que não pretendem trabalhar enquanto estudam, e 22% indicaram que pretendem trabalhar apenas em estágio para treinamento. Os 72% restantes apontaram sua intenção de trabalhar enquanto estudam. Assim sendo, parece natural que estes alunos procurem nas Ciências Sociais uma formação que lhes permita uma inserção confortável no mercado de trabalho. Ou seja, esperem do curso uma formação predominantemente utilitária, voltada para o treinamento profissionalizante” (SILVA, Nelson do Valle, 1994)

[17]  “Ao encerrar-se o curso, será  feito um apelo para a organização  de uma ação social visando atender o bem-estar da sociedade. As participantes do curso, que na expressão do 1º Relatório do CEAS para ali haviam acorrido desejosas de “se orientar, de esclarecer idéias, de formar um julgamento acertado sobre os problemas sociais da atualidade”, constituíam-se de jovens formadas nos estabelecimentos religiosos de ensino, representativa expressão feminina das famílias que compõem as diversas frações das classes dominantes e setores abastados aliados” (CARVALHO, Raul; IAMAMOTO, Marilda Villela, 1998, p.168.).

[18] “No caso do setor saúde houve, nestes últimos anos, um franco processo de feminização do contingente de trabalhadores, apesar da tradicional vocação desse setor em absorver mão-de-obra feminina no desempenho de uma grande parte das tarefas e funções existentes no processo de trabalho. É o caso, por exemplo, do pessoal de enfermagem (nível superior - enfermeiras - e nível médio e elementar - auxiliares e atendentes), que tradicionalmente absorve mulheres para suas atividades. Desta forma, estamos nos referindo a esse “processo de feminização” a profissões que historicamente eram desempenhadas pelos homens, como por exemplo os médicos e os odontólogos. Essas duas profissões, ao longo de sua história, vêm perdendo a hegemonia masculina na sua composição, incorporando cada vez mais uma parcela considerável de mulheres” (LABRA, Maria Eliana, 1989, p.. 122/123).

[19] “Como deve ter ficado aparente das sucessivas comparações feitas acima, existe uma forte correlação entre as notas médias obtidas pelos classificados para as diversas carreiras, independentemente da matéria ser de caráter científico ou humanístico”. (SILVA. Nelson do Valle, 1994, p. 5).

[20] “Hoje, podemos dizer que mais de 50% das matrículas universitárias são femininas. No entanto, há de se questionar as áreas escolhidas por essas mulheres universitárias. Boa parte delas encaminha-se para a Pedagogia, Psicologia, Letras, Enfermagem, Assistência Social, que são profissões sabidamente de pouco ‘prestígio’ e de baixa remuneração no mercado de trabalho.”  (LABRA, Maria Eliana, 1989, p.122).

[21] Em outubro de 1999 houve o XXXVII Congresso de Educação Médica, em Brasília, onde foi enfatizada a necessidade de mudança curricular, e em dezembro do mesmo ano, também em Brasilia, foi realizado o Seminário Nacional promovido pelas entidades de representação do Serviço Social, cuja temática foi: A Política de Ensino Superior no Brasil: a  regulamentação da LDB e  as implicações para o Serviço Social.